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domingo, 27 de novembro de 2016

Samba faz 100 anos

Pandeiro, timba, surdo, violão e cavaquinho. Para muitos, basta apenas uma caixa de fósforo para cantar a vida, o morro, as noitadas ou um amor. E é contando a história de um povo que o samba completa hoje, oficialmente, 100 anos. Foi em 27 de novembro de 1916 que um carioca de 26 anos, frequentador de rodas de música, chamado Ernesto Joaquim Maria dos Santos (1890-1974), conhecido como Donga, registrou na Biblioteca Nacional o samba batizado Pelo Telephone, considerado o primeiro samba brasileiro a partitura da canção está na ilustração ao lado.

O samba faz parte do DNA brasileiro, herança também de um povo oprimido, escravo. Há quem diga que o gênero nasceu na Bahia e há também quem acredite que tenha sido no Rio de Janeiro. Melhor dizer que nos dois. O que se sabe é que ao longo dos anos, o samba serviu, e serve ainda, para dar voz ao negro, colocá-lo na sociedade, seja por meio de uma roda de samba ou de show em uma grande casa de espetáculos, para quem quer que seja.
Herom Vargas, historiador e professor da Universidade Municipal de São Caetano e da Universidade Metodista de São Paulo, conta que o samba, por situação histórica, se tornou música nacional nos anos 1930. “Havia indústria cultural nascente, o cinema sonoro, a rádio, e tudo concentrado no Rio de Janeiro. E o samba entrou nessas estruturas”, explica ele, que relembra ainda que, naquele período, havia um governo populista, que se interessava por isso, instalado no Rio de Janeiro. “O samba carioca se tornou essa figura central”, diz.
A palavra que dá nome ao gênero musical vem da expressão africana ‘semba’, que quer dizer ‘umbigada’, em referência a dança de roda. E foi assim, nas rodas, nos grupos e encontros sem pretensão que surgiram diversos compositores, cantores e instrumentistas. Na verdade, ainda é assim.
Nos anos 1930 o Rio de Janeiro viu surgir Moreira da Silva. Viveu quase 100 anos. Morreu em 2000, aos 98 anos. Lá atrás cantou de mulheres, mas também sobre a violência contra elas Na Subida do Morro. Cantou também Ererê e Rei da Umbanda. E vieram muitos outros: Candeia (1935-1978), Monarco, Noel Rosa (1910-1937) e Paulinho da Viola. O samba fez cantar Cartola (1908-1980), que só conseguiu fazer seu primeiro registro quando já tinha mais de 60 anos, em 1974. Batizado com seu nome, o disco é um clássico com temas como Disfarça e Chora e Corra e Olhe o Céu. O samba tomou proporções e ganhou o Brasil, suas ruas e avenidas.
E se essa linguagem musical serve para levar alegria, é também ferramenta para assuntos mais sérios. “O samba criticou fatores sociais. Narra a vida do povo, da favela. Há posicionamento político e social, mesmo quando é uma situação cotidiana. É a vida na favela, subir o morro com uma lata de água na cabeça”, explica o historiador. Basta escutar Bezerra da Silva para perceber várias críticas.
Em São Paulo, um dos grandes nomes do samba foi Adoniran Barbosa (1910-1982), que teve inclusive parte de sua vida ligada ao Grande ABC. Morou em Santo André, na Rua Dr. Cesário Mota, da metade dos anos 1920 até 1930. Trabalhou na cidade como pintor e tecelão. Em Trem das Onze, quando canta “Moro em Jaçanã/Se eu perder esse trem/Que sai agora às onze horas/Só amanhã de manhã”, se referia a Santo André, mas ‘Jaçanã’ tinha melhor rima com ‘amanhã de manhã’.
O clássico de Adoniran, entre tantos outros, ficou famoso com o Demônios da Garoa, considerado o grupo vocal mais antigo ainda em atividade: são mais de 70 anos de estrada. Para Izael (timba), no conjunto há mais de duas décadas, o samba é criado para a massa, vem da classe popular. “Hoje ele é de todas as classes sociais. Antes era diferente, era censurado. Tinha preconceito”, afirma o músico.
Para Izael, que até hoje canta diversas pérolas de Adoniran junto ao Demônios, o samba, para a cultura brasileira, é muito importante. “É um ritmo conhecido no mundo inteiro e divulgado em todos os lugares.”
E como não citar Agostinho dos Santos, um dos maiores cantores do Brasil. Entoou temas como Balada Triste, Samba em Prelúdio e Manhã de Carnaval. Agostinho morreu em 1973, em acidente aéreo. Sua filha, Nancy dos Santos, mantém um espaço em São Bernardo, o Ferradura, reduto de samba e para quem quiser relembrar Agostinho.

Nomes não faltam para ilustrar o ritmo. Seja com Ary Barroso (1903-1964), Heitor dos Prazeres (1898-1966), Arlindo Cruz, Zeca Pagodinho, Beth Carvalho e Dona Ivone Lara, ou até com a nova geração, que não para de experimentar, colocando o ritmo com rap, reggae e o que for, afinal, o samba acompanha a evolução da sociedade.
Para a cantora e compositora de Santo André Giselle Maria, a partir do samba podemos entender a construção do nosso País. “É de suma importância para a cultura brasileira. Ele acompanha as mudanças da sociedade, a criação das favelas”, diz ela, que lembra ainda que a linguagem serviu e serve como fomentação da cultura afro. “O samba tem a missão também de mostrar a valorização da cultura negra, a importância dela dentro do nosso universo cultural. Continua dando voz à periferia”, encerra.

Via Diário do Grande ABC

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